O Bebê-diabo


Há mais de 40 anos nascia o Bebê-diabo. O fato aconteceu no dia 11 de maio de 1975 em uma maternidade de São Bernardo do Campo e sua curta vida foi coberta pelo Notícias Populares.


Ao contrário de todos os recém-nascidos, o Bebê-diabo nasceu com a capacidade de falar e fez ameaças aos funcionários da maternidade que o contrariassem. Como era de se esperar, o pequeno capeta era violento, dotado de um péssimo senso de humor e pouco adaptado ao ambiente familiar e hospitalar. Tais características fizeram com que a criaturinha fugisse da maternidade onde estava internado.


Esta fuga teve consequências desagradáveis para a população do ABC. Começaram a circular boatos sobre brigas entre casais harmoniosos, acidentes automobilísticos com várias vítimas e outros fatos estranhos. O diabo, ou melhor, o Bebê-diabo estava solto e mais ativo do que nunca.




Uma das últimas notícias sobre esse estranho personagem foi a respeito de sua última fuga. Sequestrado por fanáticos religiosos determinados a dar um fim em sua curta vida terrena, o Bebê-diabo seguia rumo ao Nordeste. Como não havia notícias sobre a criança desde então, no dia 5 de junho de 1975, o Notícias Populares anunciava que Zé do Caixão iria a Salvador para mandar o filhote do tinhoso para o inferno, seu verdadeiro lar.


Apesar de todos esses esforços, o pequeno capeta voltou a ser visto. Este, no entanto, foi o seu último avistamento. Não se soube mais notícia alguma sobre esse personagem.


De curta duração, a saga do Bebê-diabo revela o interesse humano por qualquer personagem que encarne o mal. O Notícias Populares viu sua tiragem diária subir de 70.000 para 150.00 exemplares. As igrejas que mais crescem no Brasil apelam sempre para a presença do capeta.


Parece que realmente o diabo não é tão feio quanto se pinta. Ele costuma até se encontrar com pessoas desejosas em desenvolver sua destreza musical. Dois famosos casos são os de Paganini e Robert Johnson.




Além dessas, outras narrativas se constroem a respeito da capacidade de sedução do Tinhoso. Os violeiros sabem que a afinação conhecida como Rio abaixo foi usada pelo capeta para seduzir e tirar as moças do bom caminho. Portanto, cuidado com o violeiro que usa essa afinação!


Fica agora uma questão: por que o diabo tem tanta capacidade de sedução? Por que esse personagem desperta tantas narrativas?


Não sei se minha resposta é válida, mas penso que por trás dessa atração há uma necessidade humana de se deificar. Muita gente pode achar esta afirmação sem sentido e me retorquir da seguinte forma: “Como a atração por um ser maligno pode deificar o ser humano? Você ficou louco?”


Confesso entender tal reação, mas meu pensamento não é tão sem lógica quanto parece. Vamos pensar um pouco. Todas as religiões colocam o ser humano afastado de Deus e entregue ao mal. Somos, portanto, mais propensos a cometer atos com consequências ruins do que a realizar boas ações.


O mais curioso é que toda mitologia também possui uma divindade que personifique e inspire o mal na humanidade. No ocidente chamamos essa figura de Diabo. É ele o responsável pelo mal em nossa sociedade e em nosso interior. Essa é a afirmação que ouvimos diariamente.




O mal, entretanto, não é fácil, nem bonito de se assumir, pois assumir o mal é assumir a humanidade; e se tem algo que o ser humano não gosta é de assumir a sua humanidade. Todos queremos ser super heróis, pessoas dotadas de habilidades invejáveis, praticamente semi-deuses. Na verdade, queremos ser vistos como Deuses mesmo.


Entretanto, o nosso lado terreno é muito ativo e quando menos esperamos chutamos o pau da barraca. Neste instante surge a questão: “por que um ser com tantas qualidades divinas como eu pode fazer uma coisa tão má?”  A resposta obviamente não tarda: “Só pode ter sido influência do Diabo!”


Diabo! Esta figura divina decaída nos coloca em uma batalha espiritual e nos eleva a condição de seres rivais e similares a Deus! Não fosse por ele seríamos apenas mortais em crise existencial por não sabermos quem somos, de onde viemos e para onde vamos. Com ele, no entanto, parecemos ser apenas marionetes controlados ora por uma divindade, ora por outra.

Talvez a grande necessidade do ser  humano seja um exorcista. Não dos filmes de Hollywood, mas um que retire a ideia do Diabo de nossas cabeças para assumirmos nossa humanidade.

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