Exposição x Imposição


As redes sociais tem dado voz a vários tipos de pessoa e, como consequência, a dificuldade em se entender os fatos se torna cada vez mais complicado. Soma-se a isto um número cada vez maior de pessoas que emitem opiniões e informações sem checar a veracidade e a qualidade do que se divulga.


A vítima do último fim de semana foi uma exposição cujo tema é a diversidade sexual retratada na arte brasileira. A mostra inclui obras de Adriana Varejão, Cândido Portinari, Fernando Baril, Hudinilson Jr., Lygia Clark, Leonilson e Yuri Firmesa, ou seja, pesos pesados das artes plásticas.



Confesso não saber do nível de engajamento desses artistas na causa LGBT, mas fiquei muito assustado ao ver um vídeo em que se evocava a legislação brasileira para enquadrar um artista no crime de BLASFÊMIA. Senti como se o Brasil tivesse mergulhado em um buraco de minhoca e emergisse durante o período da Inquisição Espanhola. Não foi isso, entretanto, o que aconteceu.


Para divulgar a sua mensagem em defesa da moral e dos bons costumes, os realizadores do vídeo filmaram as obras com ângulos e tomadas favoráveis ao seu modo de entender a exposição. Como bons fundamentalistas ficaram presos a detalhes que falavam mais de si do que da obra de arte.


É bom lembrar que a arte, mesmo a que nos escandaliza, é conservadora. Não que a arte zele pela moral e os costumes aceitos pelas pessoas de bem do nosso tempo. A arte é conservadora no sentido de ser um reflexo do seu tempo, de mostrar e de denunciar a sociedade e a vida como elas são.



A indecência não está, portanto, na obra de arte e sim nos olhos e mentes dos espectadores. Ao ver em  público o que sabidamente acontece nos bastidores, muitos reagem de forma agressiva e desproporcional. Voltam no tempo e qualificam esse tipo de arte como degenerada, mesmo termo empregado pelos nazistas em 1937 paradefinir as obras modernistas em exposição na cidade de Munique.


Lembro-me também da situação vivida por Pablo Picasso após finalizar  “Guernica”. Nesta obra, o artista espanhol mostra o estado em que a cidade de Guernica ficou após o ataque do exército alemão. Ao se deparar com a fotografia desse painel no apartamento de Picasso em Paris, um oficial nazista dirigiu-lhe a seguinte pergunta:

- Foi você que fez isso?
- Não! - respondeu Picasso - Vocês o fizeram.


As obras não são o produto da mente isolada e privilegiada de um artista. São fruto de olhares atentos ao que acontece ao nosso redor. Não é à toa também que o evento se chama “exposição”, pois nele a sociedade é exposta.


Ao fazer sua exposição o artista democratiza o que está oculto e, assim, oferece-nos uma oportunidade de nos reavaliar e descobrir novas caminhos. Os seus opositores, por outro lado, fazem uma imposição de valores que mascaram a realidade e oferecem um beco sem saída como cura para todos os males.

Gostaria de finalizar esta reflexão com uma brincadeira a partir do que afirmei acima. Nesse sentido será que os autores da “imposição” do fechamento da mostra Queermuseu são impositores ou impostores?

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